Um homem e uma história
“A minha história e a história do Pão de Açúcar se confundem”.
Artigo extraído da Revista Isto é.
A história do Grupo Pão de Açúcar pode ser dividida em duas partes. A primeira remete a 1929, quando Valentim, o patriarca dos Diniz, hoje octogenário, embarcou num navio com o sonho de começar vida nova na América. O imigrante português acabara de cruzar o Atlântico e encantou-se com a beleza de um maciço de pedra no horizonte. "É o Pão de Açúcar", avisou um passageiro. A partir de uma discreta padaria, o jovem lusitano ergueu, em 1948, um estabelecimento que se tornou ponto de encontro das madames paulistanas na época: a doceira Pão de Açúcar. Dez anos depois, foi aberto o primeiro supermercado. Logo seriam dezenas espalhados País afora. A segunda parte da história da empresa tem como marco a recuperação do abismo em que ela se encontrava no final dos anos 80. É aí que entra o ímpeto empresarial de Abílio dos Santos Diniz. Quatrocentas unidades da rede haviam sido fechadas e mais de 30 mil funcionários, demitidos. Parecia não restar alternativa senão esperar o grupo definhar até morrer. Abílio não se conformou. Vendeu imóveis, tomou empréstimos e anunciou a venda dos carros cedidos aos gerentes e diretores. Depois, extinguiu braços do Pão de Açúcar, como os supermercados Jumbo e Minibox, contaminados pela imagem de careiros. A tacada final foi seduzir as donas de casa com promoções irresistíveis. Deu certo. Hoje, o grupo tem 340 lojas e fatura R$ 5,47 bilhões por ano. "Chegamos até aqui com trabalho e humildade, mas agradeço primeiramente a Deus", disse a ISTOÉ este devoto de Santa Rita de Cássia.
Inferno astral
Paulistano nascido a 28 de dezembro de 1939, Abílio cresceu entre os fregueses da confeitaria do pai e as barras de ferro da academia onde começou a praticar capoeira e levantamento de peso. Dividindo-se entre o estudo e o esporte, o esbelto rapaz de 1,80 m de altura formou-se aos 20 anos em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Fazia planos de seguir carreira acadêmica - cursou pós-graduação na Michigan State University -, mas a missão de ajudar na direção da empresa falou mais alto. Começou como gerente de vendas, quando o Pão de Açúcar era uma locomotiva que se expandia a todo vapor. Os supermercados ganhavam os clientes dos antigos açougues e mercearias de bairro. Com Abílio à frente do negócio, o grupo tornou-se um dos maiores conglomerados do Brasil e abriu filiais em Portugal.
O inferno astral veio no final dos anos 80. Primogênito de seis herdeiros, Abílio só se tornou sócio majoritário da empresa após uma série de desavenças familiares. O assunto se resolveu com a redistribuição das ações - Abílio ficou com 51%, seu pai com 41% e sua irmã Lucília com 8%. Mas aí vieram os planos econômicos congelando preços que colocaram o Pão de Açúcar à beira da insolvência, sem dinheiro sequer para pagar os fornecedores. Para completar, em dezembro de 1989, Abílio foi sequestrado em São Paulo e libertado depois de 153 horas no cativeiro.
Os tempos de vacas magras fazem parte do passado. Nos últimos anos, o Grupo Pão de Açúcar incorporou alguns de seus principais concorrentes - Paes Mendonça, Extra, Peralta e Barateiro. "Nosso desafio agora é penetrar na periferia com as marcas que adquirimos", anuncia Abílio. A saúde do grupo se estende aos funcionários. Abílio se dá ao luxo de manter uma academia de ginástica para qualquer empregado disposto a malhar. Pelo menos 800 usam e abusam da regalia. "Quem faz esporte aprende a lidar com a competição no trabalho", afirma.
Goleiro
Na verdade, ele mesmo irradia bons hábitos. Acorda às cinco horas da manhã para correr dez quilômetros. Evita almoços de negócios, pois reserva o horário para nadar ou fazer musculação. A jornada esportiva é complementada pelo jogo de squash no final da tarde. "Fui goleiro no clube dos advogados de São Paulo e, se quisesse, poderia ter virado profis-sional", jura Abílio. A julgar pela quantidade de troféus e medalhas em sua sala de trabalho (ele já praticou halterofilismo, motonáutica e triatlo, entre outras modalidades) não se trata de nenhum exagero.
Aos 59 anos, está casado pela segunda vez e tem quatro filhos. Os dois mais novos não querem saber de envolvimento nos negócios. Adriana mantém distância da empresa e Pedro Paulo continua ganhando seu espaço nas pistas da Fórmula 1. "Fico nervoso quando acontece algum acidente, mas garanto que nunca vou pedir para ele parar de correr." Já os filhos mais velhos, Ana Maria e João Paulo, contribuíram decisivamente na reconstrução do Grupo Pão Açúcar. Eles costumam participar das tradicionais reuniões que Abílio faz com cerca de 40 diretores todas às segundas-feiras de manhã na sede em São Paulo. Estampada na parede, uma frase do dramaturgo francês Jean Cocteau dá uma pista do espírito empreendedor do patrão: "Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez."
VOCÊ SABIA?
Às quartas-feiras de manhã, os funcionários estão sempre preparados para suas visitas-surpresa. Abílio verifica os preços, observa o atendimento e serve cafezinho para as senhoras que esperam na fila da carne. Mas fica uma fera se encontra algum caixa sem atendente.
- ABÍLIO DINIZ Nasceu em São Paulo, Brasil, 29 de dezembro de 1936); é um empresário brasileiro, fundador do grupo Pão de Açúcar, e dono de uma das maiores fortunas do País.
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